segunda-feira, 30 de junho de 2008

Estranhos

Lucas é sozinho, se sente sozinho. As pessoas, às vezes, se sentem assim. Como pode existir solidão se o mundo é habitado por seis bilhões de pessoas? Construímos amizades, vivemos entre familiares, mas mesmo assim, estamos só. Ficando no quarto oculto da incompreensão, sem ter ninguém para comunicar, falar como nos sentimos agora. Querer gritar para chamar a atenção, atenções que sempre estão em outras direções, mas não consegue. O computador se tornou o “conformador” da sociedade moderna. Com ele as distâncias se encurtam, mas o problema é ele se tornar a principal fonte do encontro. O medo de encontrar. Todo o dia Lucas ficava horas no computador, se distraindo, conversando. Ele tem muitos amigos, porém não encontra mais nenhum. Apenas diz um “oi” pelo msn. Às vezes, mesmo entre amigos, ele não se sente totalmente integrado, talvez a par de alguma coisa.

Na outra rua mora Juliana. Ela é sozinha, se sente sozinha. Ela quase casou. Terminou o noivado de dois anos. Esse seria o maior erro da sua vida, pois a infelicidade já a tinha pego em tempos de namoro. O amor é abstrato. O amor é complexo. Mas o amor não explica nada, não é deus. Ninguém tem fé nele. O amor não pode ser medido, não pode ser padronizado, não é alguma coisa estática, talvez por isso, não interessa as pessoas. A busca pela estabilidade, pela segurança. O amor é instável, isso gera medo. A vida tem que ser uma linha reta. O fim dela é o futuro, e sempre está presente. Pensar no futuro trás segurança, ter um objetivo, uma meta. Viver a vida é fazer planos. Quando os planos não saem como desejado, o que ocorre com uma certa freqüência, o desespero entre cena. A vida acaba. Não há espaço para o amor em meus planos, porque certamente ele os destruirá. Como eu vou poder amar? O amor não existe para mim, pensava Juliana que sonhava em ser médica, e estudava sem parar para passar no vestibular, estudava para lembrar, estudava para esquecer.

À primeira vista

Passando pela mesma rua, Lucas e Juliana se encontraram. O primeiro choque de olhares é sempre muito frio. Um olhar estético que parte do rosto, acompanha o corpo e vai até os pés. O foco principal é o rosto. A beleza do rosto é quase essencial, mas pode ser recompensado pela beleza do corpo. Lucas logo percebeu a beleza de Juliana. Seu rosto tinha contornos suaves, olhos macios, porém não viu seu sorriso, pois sua expressão era séria. Juliana não achou nada que chamasse a atenção em relação a Lucas. Só que ele era fofinho.

À segunda vista

Por coincidência ou não, o nome dessa rua era encontro das flores. Foi nessa rua, a mesma rua, que Lucas e Juliana se encontraram pela segunda vez. O segundo choque de olhares é marcado pela lembrança. Eu já o vi antes. Eu a conheço de algum lugar. Começa-se a perceber outras coisas. Ela tem um jeito legal. Ele parece simpático. Começa as indagações. Será que ela vai querer alguma coisa comigo? Acho que até ficaria com ele. Fica no ar aquela vontade de falar alguma coisa, de pelo menos saber o seu nome, mas as bocas ficam caladas, talvez pelo sentimento opressor da timidez. Cria-se uma barreira entre eles. Nesse momento essa barreira é fraca, mas difícil de romper para alguns. As relações ainda são superficiais, não há muito estímulo para quebrar esse obstáculo numa fração de alguns segundos.

À terceira vista

Então vem a terceira vez. Nessa se percebe os sorrisos. Nessa se percebe os gestos, pequenos detalhes, grandes detalhes. Nessa, os olhos são o alvo principal. Como eles brilham. E nessa hora, que a barreira fica mais forte. Você faz de tudo para quebrar, mas não consegue. Às vezes, pensa que se quebrar, tudo pode desmoronar. Então é melhor não tocar. Às vezes, é melhor esperar uma chance para ultrapassá-la. Porém, nunca chega essa oportunidade, ou quando ela chega você não percebe. Você percebe que está apaixonado. Você quer conhecê-la, você quer conversar com ela. Talvez ela não se importe, ou ela também se apaixonou, mas não conseguiu romper esse imenso obstáculo, que se formou na frente de vocês dois. Ficam os dois parados, se olhando, imaginando. O tempo está se esgotando, e eu não estou fazendo nada. Isso ainda vai acabar comigo. Talvez amanhã, eu tenha uma chance, talvez daqui alguns anos eu tenha uma chance. O tempo acaba. Maldito tempo. Queria que ele parasse nesse instante. O que eu estou sentindo? Juliana não sabia. Parecia gostar do simpático sorriso de Lucas. Via alguma cosia diferente nele. Talvez uma coisa que nunca tinha visto. Uma coisa que não a deixava se concentrar nos estudos. Era mais forte. Estava fragmentando sua vida. Em pequenos momentos. Essa barreira é cômoda, talvez para proteção. Acho que vou esquecer isso. Não quero ninguém na minha vida agora. Não devo vê-lo mais mesmo. Tenho que endireitar minha vida, colocá-la nos trilhos.

Lucas, com as mãos no bolso, lentamente, vai andando pela rua, pensando. Será que vou encontrá-la hoje? Mas ela não aparece mais. Todo dia passo por essas ruas, mas não a vejo mais. Um dia, na casa de um amigo. Ele queria me apresentar uma pessoa. Então surge Juliana. Olhos os olhos, nós dois dizemos, ao mesmo tempo, “oi”. A vida saiu dos trilhos. Seus planos são destruídos. A linha se quebra, vira pedacinhos sem direção. A barreira começa a ruir, as palavras começam a sair. E ai você se joga no fundo. Conhecer profundamente. O que tem lá dentro? Pensamentos, sentimentos, agora compartilhados, agora em melhores mãos. Não mais estranhos.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

O louco

- As árvores trocavam de folhas de tempos em tempos. Os homens selvagens dançavam para que a água caísse do céu. Havia duas estrelas no céu, uma aparecia à noite, a lua, e outro aparecia de dia, o sol, as duas estrelas eram veneradas, pelos seus poderes mágicos que possuíam. Os homens selvagens lutavam com os animais para saber quem era o mais forte...

Percebendo que seu filho já dormia, fechou o livro e deu um beijo na testa do menino:

- Boa noite, filho.

Então o doutor saiu de casa apressado, ligou o carro, e foi para o trabalho no hospital psiquiátrico. Ele era psiquiátrico, aqueles que curam a loucura dos loucos, não com balde de água fria, mas com métodos científicos, do qual o principal é a conversa. A noite estava movimentada, alguns sustos, alguns pacientes chegando, nada de anormal na rotina do hospital:

- O que temos para hoje? - Perguntou o doutor.

- Você tem um paciente novo.

- O que ele tem?

- Ele diz que a natureza existe.

- Mais um?

- É, parece até epidemia.

- Apronte-o. Estarei na sala de conversa.

- Está bem.

Já era tarde, o cansaço batia nos olhos, mas ele continuava esperando mais um paciente. Pela porta, entra o louco, com seus braços presos na camisa de força, mas seu olhar sereno, tranqüilo. Ele sentou-se, começaram a conversa terapêutica:

- Como está? - Disse o doutor.

- Poderia estar melhor.

- Então acredita na natureza?

- Ela existe. Não falarei mais nada, pois não acreditarás.

- Não, por favor. Conte.

- Eu vi as árvores, eu escutei os pássaros cantando, Eu senti os raios solares no meu rosto. Isso foi incrível.

- Você viu o sol? Mas pensava eu que a natureza só existia em livros infantis, que os pais liam para as crianças. A natureza é uma criação da imaginação humana. Você tem algum trauma?

- Não que eu saiba, me diga você. A natureza não é imaginação, ela é real, eu a pude tocar.

- Esta sua fixação pela imaginação é uma fuga do real. Do que você foge?

- Eu não fujo de nada. O meu lugar não é aqui, não sei porque eu voltei, sou um tolo. A natureza está mais perto do que você imagina.

- Onde está a natureza?

- Está atrás da área restrita.

- Mas a área restrita é uma área contaminada com material radioativo, por isso não podemos ir lá. Aquele lugar é a morte para o ser humano.

- Para chegar na sua essência, você deve enfrentar seus medos. Enfrente essa mentira, e chegará na verdade. A natureza é a nossa essência. Respire fundo, por favor.

Não achou nada de mais, então respirou bem fundo.

- Não sente que o ar que você respira está morto. Mas o ar que você respira na natureza é um ar vivo. Quando você chegar lá, respire fundo. – Indagou o louco.

- Não senti nada de diferente. – Retrucou o doutor.

- É porque você está acostumado com esse ar.

Por um segundo, o doutor acreditou no que o louco disse, mas depois refletiu, ele é um louco, ele não sabe o que está falando, ou sabe? A confusão tomou conta de sua mente, nada radical, mas alguma dúvida, talvez causada pela curiosidade. Olhando para o relógio, o doutor diz:

- Nosso tempo acabou, nós vemos da próxima vez.

- Doutor, só quero lhe falar uma coisa.

- Diga.

- Já se perguntou da onde vem a água que o senhor bebe?

Então o louco foi levado pelos enfermeiros para a sua sala, e o doutor, depois dessa pergunta ficou com mais dúvida ainda:

- Onde fica o abastecimento de água da cidade? Perguntou o doutor.

- Fica nos limites da cidade, perto da área restrita. Respondeu um enfermeiro.

Pegou o carro, e dirigiu até os limites da cidade. Havia vários imensos reservatórios, mas do principal saia uma mangueira que vinha da área restrita, não dava para ver sua origem, pois havia uma neblina. A neblina permanente radioativa, perigosa para nós, sempre aprendeu isso, desde pequeno. Vinha o medo, se atravessar à neblina, posso morrer envenenado. Vinha a curiosidade, e então a coragem, mas se eu não atravessar não saberei da onde vem à mangueira. Como que a mangueira que abastece água para nós sai de uma área venenosa? Então encarou a neblina, com medo e com coragem. Não dava para ver nada, cada passo, bem devagar, colocava as mãos para frente para ver se tocava em alguma coisa, os olhos começavam a doer, as pernas a tremer. Até que começou a ver alguma coisa, não tinha forma definida, talvez porque seus olhos ainda não estavam acostumados, lentamente, ia se criando forma, até que a neblina se dissipou, e a forma se firmou, era uma árvore, igual a um desenho que tinha visto, teve que tocá-la, mesmo assim não acreditou, e olhou o céu, a lua, não pode ser. Olhando entre as árvores via um lago, da onde a mangueira saía. Respirou fundo, e percebeu que era um ar diferente, realmente era mais vivo. Assustado, sai correndo de volta, pensando consigo, ela existe, a natureza existe.

Conseguiu se segurar. Entrou no carro e pisou fundo, tinha que voltar para o hospital. Entrou no hospital, e perguntou para o mesmo enfermeiro de antes:

- Onde está o louco que conversei mais cedo?

- Ele está na segunda porta à esquerda.

- Obrigado.

Ele seguiu em direção a sala. Olhou pela janelinha da porta e o viu sentado num canto. Abriu a porta:

- Eu vi! – exclamou o doutor.

- Você precisa me levar até lá – disse o louco.

Ajudou-o a tirar a camisa de força:

- Venha, vamos pegar uma roupa de enfermeiro.

Foram até a vestuário, sem que ninguém os visse, o louco colocou as roupas de enfermeiro, saíram pela porta da frente, foram para o carro. O destino deles era a área restrita. A neblina sempre está lá, dessa vez ela não foi problema, passaram correndo. Chegaram até as árvores, começou a chover, as gotas caiam no rosto do doutor, ainda perplexo com as novas descobertas.

- São gotas de água caindo do céu! – se espantou o doutor.

- Sim, é incrível. – respondeu o louco.

- Nós precisamos avisar para todo mundo! – disse o doutor.

- O meu lugar é aqui, eu não vou mais voltar.

- Entendo. – diz o doutor.

O doutor sai correndo, agora, ele não conseguiu segurar a emoção de ver tudo aquilo. Já estava amanhecendo, e o sol estava nascendo. Era lindo. Depois de passar pela neblina o sol sumia sem deixar rastro. Então voltou para a cidade, gritando:

- A natureza existe! Eu a vi! Eu a senti! Não existe área restrita! A natureza tem muito mais cor e muita mais bonita do que nossas paredes sintéticas sem cores e feias.

As pessoas passavam, acordaram cedo, estavam indo trabalhar, tinha que ser um louco falando que a natureza existe para perturbá-las, logo de manhã. Então, como sempre, se faz nesses casos, chamam a ambulância, e dela saem os enfermeiros com a camisa de força preparada para pegar mais um louco. O doutor nem teve reação, foi facilmente imobilizado, um dos enfermeiros, era aquele que o vira antes:

- Nossa! Mas é o doutor! Até você, doutor. Onde esse mundo vai parar?

- A natureza existe! Eu a vi! Eu a senti! - Não conseguia falar outras palavras nesse momento. E voltou de onde veio, para o hospital psiquiátrico.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Uma aventura da qual não sairei vivo

Todo dia o sol olha para mim.
Todo dia o rio me chama assim.
Todo dia eu sonho com isso.
Um dia vou ter forças
para ir de encontro a eles.
Viver a natureza selvagem.
Viver a natureza humana.
Eu quero sentir a natureza.
Eu quero que ela me sinta.
Eu quero descobrir
o que tiver para descobrir.
Estar em todos lugares.
Conhecer todas as pessoas.
Ver a lua desaparecer
quando o sol nascer
e me acompanhar
até a noite chegar.
Eu quero ver por ai
o que nao consigo ver aqui.
Ver o quanto azul o mar pode ser.
Ver o quanto verde uma folha pode ser.
Ver todas as cores da terra.
Ir onde as cores podem me levar.

Pés descalços.
Sapatos sujos de areia.
Mãos pro alto.
Braços abertos.
Cabelo com cheiro
de água doce.
Poeira nos olhos.
Barba no rosto.
Andar até
não aguntar.
Subir montanhas.
Tocar a neve.
Pegar carona.
Achar abrigo.
Pedir abrigo.
Sentir o rio selvagem
até ele se acalmar
e poder o escutar.
Nadar no lago.
Tocar na terra,
e me alimentar dela
Beber a água da chuva.
Comer o que
a fome me oferecer.
Correr sem direção.
Esperar a onda chegar.
Conhecer estranhos,
estranhos amigos
de um dia
de uma vida.
conhecer as crenças
de quem já viveu.
ver o que as pessoas
podem fazer,
para viver.
Não se importar
só quando alguém chorar.
E não ter nada,
só uma mochila,
e uma vida pela frente.







domingo, 8 de junho de 2008

Atenção e carinho

Atenção e carinho

Andando pelas ruas, vinha o homem, limpo e bonito, com algumas sacolas nas mãos e com um sorriso no rosto. Ele era católico, mas não do tipo que se diz católico só porque foi batizado, ele rezava todos os dias, freqüentava a missa todo domingo e se confessava regularmente. Em uma dessas missas o padre disse que era bom fazer boas ações, pois facilitaria a entrada da alma no paraíso. Nesse dia de sol, o homem, limpo e bonito ia fazer sua boa ação, se sentia bem, ajudaria alguém.

Sentado no chão e encostado na parede estava o homem, sujo e feio, com uma garrafa de cachaça na mão e os olhos cheios de sono. O homem, limpo e bonito, o viu. Vou começar ajudando esse homem:

- Oi!

- Oi... O que você quer?

- Só queria perguntar se está com fome.

- Estou com muita.

- Eu trouxe nessas sacolas um pouco de comida.

- Ooohhh! Valeu mesmo! - Um sorriso apareceu.

- Não é só isso, trouxe roupas limpas também.

- Não sei como agradecer por essas coisas. Valeu! – Outro sorriso.

O homem, sujo e feio, não contido pela felicidade, esboçou um abraço, mas o homem, limpo e bonito, recuou:

- Não precisa me agradecer. Agora que você está bem, eu tenho que ir.

- Mas vai para onde?

- Eu vou trabalhar.

- Fique um pouco.

- Eu não posso.

- Eu não quero sua pena, eu só quero um pouco de atenção!

- Me desculpe, eu não posso ficar, já estou atrasado e meu chefe vai reclamar comigo.

Mesmo insistindo, o homem, limpo e bonito, deu um seco adeus e foi andando na direção contrária. O sorriso foi embora tão facilmente quanto chegou. Amanhã, estarei com fome, amanhã, minhas roupas estarão sujas, porém uma troca de palavras para acalmar minha alma pode alimentar minhas lembranças. O homem, sujo e feio, foi andando, sem horizonte, falando com o céu, ou talvez, com Deus, Quem é que vai saber?

sábado, 7 de junho de 2008

Quando o mundo acontecer

Quando o mundo acontecer

E quando a vida chegar,
viver feliz.
E quando a morte chegar,
morrer feliz.
E quando o tempo chegar,
te conhecer.
E quando o céu estiver azul,
plantar uma árvore marrom.
E quando não estiver aqui,
estarei ali.
E quando eu aprender,
também vou ensinar.
E quando eu chorar,
espero não estar sozinho.
E quando eu sorrir,
espero não estar sozinho.
E quando a estrada aparecer,
perceberei o quanto ei de percorrer
E quando sol nascer,
o frio não vai aparecer
E quando eu olhar para você
não esconda quem você é.
E quando eu olhar para você
não tenha medo de mostrar
o que você nao aguenta mais segurar.
E quando o mundo acontecer
estaremos lá para ver
e quem sabe nos entender.
Por mais que palavras,
se cortaram.
Por mais que sentimentos,
se chocaram.
Por mais que diferenças,
se confrontaram.
Eu não quero te perder.
Eu não quero estar sozinho,
quando o mundo acontecer.