Fico aqui pensando se aquelas mentiras apareciam na inconsciência dos homens pelo momento conturbado de suas cachaças ainda estarem no copo esperando que a tristeza pudesse suportá-los, mas não sei bem. Pensam que bêbados podem ser exaltar ou controlar a situação, mas não conseguem aguentar nem a si mesmos que choram pelo descuido de deixarem a mostra a sua dor, pânico de seus olhos moribundos, perturbados pela carência do que sentem e presos no seu próprio desabafar. Ainda lembro daqueles olhos pequenos, cheios de lágrimas que nunca caíram, a boca áspera e machucada com bafo de álcool infestando minhas narinas quando ele falava que me amava, e eram tantas e tantas palavras que eu me acabava me perdendo nelas, não sabendo como tinha começado, ou o que significava todas elas, porém sabia onde isso tudo ia terminar, na crença de mais palavras construídas por um estado de espírito abalado, neutralizado pelo néctar dos deuses, o paraíso dos viciados em matar o sofrimento com gotas de orvalho vendidas em qualquer esquina. Não havia escolha em abraçá-lo, esperando que alguma ternura aparecesse de algum lapso de memória, ou gesto singular de alguém sensibilizado com o momento, mas apertava forte, como um touro, me esmagando o peito, machucando minhas costas, que me proporcionava uma dificuldade de respirar pela pressão em meus pulmões, depois ele parecia sereno, fechando os olhos bem devagar, até talvez, dormir em meus braços, pois afrouxava as amarras e amolecia o corpo querendo se espatifar no chão, então sobrava para eu segurá-lo e jogá-lo em algum canto qualquer para ele apagar por aquele dia.
No dia seguinte, dizia que não lembrava de nada, e pedia desculpas esfarrapadas pelo o que sua mente alcoolizada tinha feito, pois a culpa era do álcool que tinha atrofiado suas perspectivas, que tinha castigado suas ambições, destruído seus sonhos mais íntimos e matava sua esperança que a vida pudesse se abrir em um leque de novas possibilidades. Não podia deixar que tudo terminasse assim. Pedia uma regeneração. Ele reclamava que nada dava certo, e começava a gritar pelo impulso da ressaca que deixava sua boca seca e a voz meio rouca. Argumentava com toda a raiva que transbordava de sua causa perdida, não me deixava responder aos seus insultos, não conseguia dizer uma única palavra, então também elevava a minha voz, e ficamos cuspindo palavras que ninguém mais escutava, apenas as paredes absorviam aquela algazarra. No final, ele resmungava que a culpa de tudo aquilo era minha. Xingamentos se chocavam no ar. E na calmaria do cansaço em dizer, o silencio invadia nossa privacidade e cada um ia para o seu canto pensar no que tinha acontecido. Descobrimos que não dava mais, e fortes em nossa decisão de pessoas maduras, desistimos do nosso passado, cravamos as estacas em nossos corações que sangravam há muito tempo, acomodados com esse estilo trágico de vida. Ele ia embora, e eu ficava.
E ficava como sempre fiquei, esperando que tudo pudesse ser diferente. Tantos e tantos homens passaram pela minha vida, e como nem os orixás pudessem revelar, contra toda a espécie de destino pronto, tudo se repetia, com todos os passos, com todas as cartas marcadas, e o mesmo final sempre igual. Não me arrependo de nada, não posso ter esse luxo, seria como dizer que errei, ou que a culpa sempre foi minha, mas lamento por ainda guardar uma poesia escrita por ele em papel de caderno amassado depois de uma noite de amor na qual só me lembro por causa dessa lembrança, ainda presente, cheias de palavras, talvez, sinceras, talvez, as únicas.
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