domingo, 14 de dezembro de 2008

Poemas miseráveis

De quantos poemas eu preciso para escrever sobre a solidão? Eu preciso de muitos. Preciso escrever um livro de poemas. A editora quer que eu entregue no final do mês. O tempo não me preocupa. O problema é a solidão como única fonte de inspiração. O medo de reconhecer que está sozinho, olhar para os lados e não ver ninguém. Rafael sentado na sua poltrona de alguns muitos reais, todo estabanado. Seu corpo está solto, não tem controle sobre ele. Na sua mão esquerda um cigarro apagado. A preguiça é vencida. As mãos na poltrona, os pés no chão, o corpo levanta. Alguns metros se passam. Agarra o isqueiro, que estava em cima do balcão do bar (um pequeno bar com suas bebidas preferidas, de vodka a cachaça) com uma das mãos, faz um movimento pra que o fogo apareça. Acende o cigarro. Solta aquela primeira fumaça. Aquela do alívio. Coloca o cigarro no cinzeiro que está em cima da mesinha da sala. Olha para o bar. Não sabe qual das garrafas escolher. Coça o rosto. Indecisão tem tomado conta da minha vida. Pelo menos uma bebida eu posso escolher. A vontade era de tomar uma cachaça, mas não tinha uma garrafa. Pegou a de um vinho chileno. Tinha ganhado de presente de alguém, porém não se lembrava de quem. Com um saca-rolha abre a garrafa. Entorna para dentro do estomago. Alguns goles. Retorna para cigarro. Algumas tragadas. De novo no cinzeiro. Outros goles. Do apartamento, dava para ver os carros passando e as pessoas andando. Falta ar aqui. A janela é aberta. De algum lugar à vontade de vomitar chega. A garrafa de vinho é bruscamente colocada em cima da mesinha da sala. A porta do banheiro é aberta abruptamente. A respiração fica ofegante . Está faltando ar aqui. Olha para o espelho. Joga uma água no rosto. Sente o vomito passar pela sua garganta, invadir sua boca e sair. A pia fica imunda. O que está acontecendo comigo? Há quantos dias eu não durmo? Porque você me deixou? Eu pensei que algumas coisas durassem para sempre. Porque não durariam? Você não sabe o que deixou. Sabe o que você me deixou? Palavras, palavras e mais palavras. Poemas miseráveis. Não é culpa sua. Mas está acontecendo. Eu não consigo sair disso. Parece que estou preso. Eu estou doente. Porque você me deixou? Preciso de uma cachaça. Já era noite.

Meu colchão de papelão não estava confortável esta noite. Preciso levantar. Suas mãos encontram uma caixa cheia de moedas. São moedas ganhadas pela esmola e que foram cuidadosamente guardadas para essa noite. Suas roupas sujas, sua barba grande não enganam ninguém. Era um morador de rua. Mas acho que isso não importava mais. Hoje vou encontrar com a mulher que amo. Ninguém sabe da felicidade que estou sentindo. Provavelmente não conseguirei jantar hoje, mas essa limitação da minha vida não vai me abalar. Cássio andava pelas ruas estreitas. Parou em uma padaria na esquina.
- Me da uma branquinha, Miguel! Que hoje eu estou explodindo!
- Que tanta agitação é essa?
O copo já estava em cima do balcão. Miguel manuseava a garrafa de cachaça lentamente deixando o líquido escorrer para o copo.
- Eu vou encontrar a mulher hoje.
- Entendi então.
- Será que você pode me arranjar uma janta?
Miguel olha para Cássio com uma expressão desconfiada.
- Está bom Cássio. Passe aqui depois.
Tomou a cachaça em uma golada.
- Pode por outra dose. – diz Cássio.
- Outra?
- Sim, eu preciso.
- Está bem.
Miguel encheu o copo. De novo tomou com uma golada.
- Obrigado Miguel.
- Tranqüilo, vai com Deus.
Cássio acena se despedindo. Andava seguro de si e do que ia fazer. Olhou de longe. Lá estava ela. Estava em uma esquina junto com uma amiga. Está na hora de falar com ela. Andou confiante. Chegou perto.
- Oi.
- Oi. Como vai velho homem?
- Eu não estou tão velho assim. Vou bem, e você?
- Estou bem também.
- Que bom.
- Qual seu nome? – pergunta Cássio.
- Sofia. Então o que você tem ai? – ela pergunta.
- Amor. – Ele responde. – com um sorriso no rosto.
- Eu não preciso de amor. Eu só preciso de dinheiro. Eu tenho um filho para sustentar. Olha, se você não quer fazer nada, não gaste meu tempo. Tenho outros clientes a vista.
- Eu sei. Eu quero. Eu tenho dinheiro. – Sacode as moedinhas na caixinha.
- Está bem. Então vamos para um quarto.
Em frente da onde eles estavam tinha um motel barato.
- Eu quero um quarto. – diz Cássio.
- Pode ficar com o segundo a direita. Não saia sem pagar, velho.
- Não, claro que não.
Os dois entram no quarto. A expectativa de Cássio era grande. Seu amor. Diante dos seus olhos. Despida. Não dava para acreditar, faria amor depois de tantos anos. Mas ninguém tinha avisado que o inverno tinha chegado. Não nevava quando eu sonhava. Tocar seu corpo gelado, não era o que eu esperava. Olhar para o seu rosto sem expressão, não era o que eu queria. O calor do meu corpo se foi. O frio tomou conta de mim. A realidade do momento pode destruir muitas coisas. Não era para ser assim. Eu não agüentava mais. Já torcia para acabar. Uma tristeza. Uma decepção. Um vazio.
- Então você me deve dinheiro, velho. – diz Sofia.
- Dinheiro, realmente é a única coisa que vale o que fizemos.
- Como assim?
- Você adicionou mais infelicidade nessa vida miserável. Obrigado. – Encheu a mão com moedas e colocou na mão dela.
Saiu do quarto, sem dizer mais nada. De novo pegou algumas moedas e entregou para o dono do hotel na recepção. A única coisa que ele precisava agora era uma cachaça.

Cássio não pensava em nada. Que tudo vá para o inferno. Eu não quero mais saber de nada. Andava, andava. Era a única coisa que podia fazer naquele momento. E nesse momento que a vida perde todo sentido. Se for para ser assim, e melhor não ser. E nessas horas que a morte consegue ser uma opção. Porque não? Acho que posso me contentar em encher a cara de cachaça. Já que não tem ninguém, o álcool pode me consolar. Depois de tanto andar, avista um bar. Senta na cadeira perto do balcão.
- O que você quer? – diz o atendente.
- Traz um uma dose de cachaça.
- Você tem dinheiro?
- Tenho – mostrou a caixa com as moedas.
- Vou pegar. – finaliza o atendente.
Cássio brincava com uma moeda, quando olhou para o lado. Tinha um homem. Bem vestido. Com uma garrafa de cachaça em uma das mãos enchendo um copo.
- As coisas devem estar complicadas para você. Com uma garrafa de cachaça... – diz Cássio.
- Realmente estão muito ruins. Mas você não está com uma cara de que está feliz. – responde Rafael.
- Também está ruim para mim.
- Então se aproxime. Vamos acabar com essa garrafa antes de acabarmos com nossas vidas.
- Claro.
Rafael encheu o copo de Cássio.
- Você mora onde? – pergunta Rafael.
- Na rua. Em alguns cantos.
- Entendo. Sua vida deve ser difícil, não me admira você estar aqui.
- Eu não estou aqui por causa disso. Ter uma vida sem muitos confortos materiais é complicada, ainda mais para um velho como eu.
- Mas você não é velho.
- Obrigado você é o primeiro que diz isso.
- Então o que te levou aqui?
- Eu não quero falar sobre isso. Mas e você. Parece ter uma vida luxuosa.
- Das minhas condições não posso reclamar, mas como você, não é por isso que eu estou aqui.
- Vai me dizer porque está aqui?
- Eu não quero falar sobre isso.
- Tudo bem. Então o que você faz?
- Eu sou escritor, principalmente escrevo poemas.
- Nossa, um poeta!
- Não precisa dessa exaltação. E você já fez alguma coisa?
- Eu já fui carteiro.
- Sério?
- Sim, eu adorava. Entregava cartas de porta em porta. Conhecia pessoas. O salário não era lá essas coisas, mas...
- Eu sei como é. Mas como chegou nesse...
- Nesse estado de pobreza? Fui mandado embora, não tenho família. Fui gastando minhas economias até vender minha casa.
- Eu compreendo. Quando eu tinha 14 anos, comecei a trabalhar. Meu pai tinha sido demitido também. Então comecei a trabalhar para ajudar..
De goles em goles, a garrafa já estava no fim.
- Parece que a garrafa já está acabando. Só tem um gole para você e um para mim. – diz Rafael.
Rafael serviu os dois. Rapidamente tomaram a última cachaça.
- Eu vou embora. – diz Rafael
- Posso ir com você? Não tenho nada para fazer. – pergunta Cássio.
- Claro.
Os dois andavam, meio cambaleando. Estavam sobre o efeito do álcool. Meio tontos meio lúcidos. Andavam. Ficaram calados. Um do lado do outro. Até que ouviram gritos bem altos.
- Mas o que foi isso? – perguntou Cássio.
- Não sei. – respondeu Rafael.
Continuaram a andar. Cássio avistou uma montanha russa. E de novo os gritos ecoavam.
- Então é isso. – disse Cássio.
- Um parque de diversões. – disse Rafael.
Os dois se olharam por instante.
- Rafael, vamos na montanha russa? – pergunta Cássio.
- É melhor não. Eu não estou muito bem.
- E quando que você está bem?
- Mas acho que vou vomitar.
- Não importa.
- Eu tenho que te confessar tenho medo de altura. – diz Rafael.
- Deixa esse medo em algum canto. – responde Cássio.
- É... Sabe, estou cansando de escrever sobre ele.
- Então vamos!
- Está bem.
Entraram no parque. Muitas pessoas. Muitas crianças. Correndo de um lado para outro. Todos alegres. Risos por todos os lados. Os dois entraram na fila. E quando perceberam já era a vez deles. Subiram uma escada. Ficaram em frente aos carros.
- Não sei se quero fazer isso. – diz Rafael.
- Agora que você quer desistir?
Rafael entra no carro. Cássio senta-se do seu lado. O nervosismo toma conta de Rafael, amenizado pelo álcool em seu sangue, mas presente. Os carros começaram a subir. Devagar. Rafael não olha para baixo. Os carros sobem devagar. Será que vou agüentar a decida? Os carros sobem devagar. O que pode acontecer? Os carros chegam no topo. Agora, não está nas minhas mãos. Os carros descem. O vento no meu rosto. Uma vontade de vomitar. Os olhos se fecham.
Acordo. Dormia em cima do volante. Estou no meu carro. O que estou fazendo aqui? Abro a porta. Saio do carro. Olho para os lados. Nenhum carro vem. De lugar nenhum. Um prédio grande a minha frente. É um hospital!
- Não! Não pode ser. - Os carros vão a toda velocidade.
Estou na recepção do hospital. O que estou fazendo aqui? Discuto com a mulher que me antende. Saio correndo. Entro no elevador. Estou em um corredor. Corro. Procuro um quarto. Acho. Espio pela porta aberta. Minha mulher. Cheia de tubos. Eu me aproximo. Ela me olha, e estica a mão. Eu a seguro.
- Não! Eu quero sair daqui! Droga! - Os carros fazem “loopings” e ficam de cabeça para baixo.
Estou sentado em um banco fora do quarto. As palmas da minha mãos estão encostadas no meu rosto. Estou chorando.
- Não!
Os carros param. Todos saem da montanha russa. Rafael fica meio atordoado.
- Você está bem? – pergunta Cássio.
- Estou. – responde Rafael.
- Dessa vez, eu vou para casa. Tem algum lugar para ir? – pergunta Rafael.
- Não. – responde Cássio.
- Então vamos lá para casa.
- Está bem.

Chegaram no apartamento. Rafael sentou na sua poltrona de costume. Cássio entrou timidamente.
- Se quiser pode tomar um banho. – comenta Rafael.
- Posso mesmo?
- Pode.
- Obrigado.
Cássio entra e no banheiro e fecha a porta.
- Espera. Vou te dar alguma roupa.
- Obrigado.
Cássio pegou as roupas e trancou o banheiro. Rafael voltou a sentar na poltrona, mas agora com um cigarro aceso na mão. Apenas olhava para o nada. Cássio termina.
- Posso usar seu barbeador? – pergunta Cássio.
- Pode.
Cássio sai do banheiro de cara nova. Diferente.
- Obrigado pelas roupas – agradece novamente.
- Tudo bem.
Cássio senta no sofá. Fica olhando para o teto.
- A vida está meio parada. – resmunga Rafael.
- É verdade.
- Então porque estava no bar hoje? – pergunta Rafael.
- Quer mesmo saber?
- Quero.
- Eu amo uma mulher, mas não sei como fazer que ela entenda isso.
- Nossa. Porque você não escreve um poema para ela?
- Eu não sou poeta. Você é. Você entende.
- Se eu sou poeta, não quer dizer que você não seja. Poeta é um título que a sociedade me dá, isso não importa. Todas as pessoas são poetas, algumas mostram para o mundo, outras guardam para si mesmas. Porque você não tenta?
- Eu não sei por onde começar.
- Eu sei como é... Respire fundo. Feche os olhos. Puxe a inspiração, como se estivesse puxando a fumaça de um cigarro. Imagine. Para a folha de papel você pode confessar. Deixe os sentimentos transbordarem para a folha de papel, passando por cada linha. As palavras vão aparecer na sua cabeça, passar pelo seu corpo, até chegar na sua mão. Não tenha medos dela, escreva cada uma. Aqui, eu tenho um caderno e um lápis. Eles são seus. Mostre o que você quiser neles.
- Obrigado. Vou tentar.
Cássio sentou em uma cadeira. Colocou o caderno em cima da escrivaninha. Começou a escrever.
- Eu vou dormir. Você pode dormir no sofá. Qualquer coisa pode me falar. Até amanhã.
- Está bem. Obrigado.

A claridade batia no rosto de Rafael, fazendo-o acordar. Ele se espreguiçou. Levantou. Andou até a sala. Cássio continuava escrevendo.
- Você ainda está escrevendo? Não dormiu?
- Não dormi. Era tanta coisa, não pude parar.
- Posso ver?
- Pode.
- Você escreveu quase o caderno inteiro. Impressionante.
- Só falta algumas palavras.
- Continue então.
Enquanto Cássio terminava de escrever, Rafael tomava café.
- Quer alguma coisa? – perguntou Rafael.
- Daqui a pouco.
- Está bem.
Depois de alguns minutos.
- Terminei. Posso comer uma torrada?
- Claro. Tome leite também.
- Obrigado.
- Posso ler? – pergunta Rafael.
- Pode.
Enquanto Cássio tomava café, Rafael lia as palavras de Cássio.
- Eu adorei. – comenta Rafael.
Cássio sentava no sofá com leve sorriso no rosto. Como era bom escrever aquilo. Como era bom...
Rafael entrega o caderno para Cássio e senta na sua poltrona.
- Então, só está faltando uma coisa. – diz Cássio.
- O que? – pergunta Rafael.
- Você me dizer porque estava naquele bar.
- Bem... É difícil falar sobre isso.
- Tudo bem, se você não quiser dizer.
- Não, eu preciso falar. Então... A minha esposa morreu de câncer há dois anos.
- Sinto muito.
- O pior é que nós temos um filho. Eu não o vejo desde a morte dela. Ele se parece muito com a mãe.
- Nossa. Você não acha que já está na hora de encarar e ver seu filho?
- Eu sei, mas é difícil.
- Eu sei que é difícil, mas é o seu filho. Até quando você vai ficar aqui parado?

Até quando eu vou ficar aqui parado? Só eu estou aqui. Um deserto imenso. Como podemos enfrentar as barreiras que nós mesmos criamos? Como enfrentar as muralhas criadas pelas dores e medos? Como caminhar através das areias do orgulho? É um caminho difícil. É árduo. Dar o primeiro passo. Pisar nessa areia. Afundar seu pé nela. Dar vários passos. Da onde sai à força para dar esse passo?
- Bom... Eu já vou. – diz Cássio. – Quero mostrar o meu caderno para ela.
- Entendo. E boa sorte.
- Vai encontrar com seu filho?
- Eu não sei.
- Até quando não vai saber?
Rafael baixou a cabeça.
- Bom... Boa sorte para você e obrigado por tudo. - diz Cássio.
- De nada.
Cássio desce as escadas. Rafael fecha a porta. Um porta-retratos virado. Cuidadosamente, o pega. Na foto, ele, sua mulher, e seu filho. Não conseguia lembrar daquele dia. Eu não consigo lembrar.

Cássio ia pela rua. Com os dois braços segurando o caderno com seus poemas. Na sua mente só a imagem dela. Procurava, procurava. Entre ruas e becos. Até que avistou sua amiga.
- Oi, sabe onde Sofia está?
Olhou mais atentamente para Cássio.
- Você é aquele velho. Está diferente. Mais elegante e bonito.
- Obrigado.
- Ela está na casa dela.
- Onde fica?
- Não é muito longe. Eu te levo lá
- Obrigado.
Os dois entraram na primeira rua, seguem e dobraram na próxima esquina.
- É aqui. Eu já vou indo. Adeus.
- Obrigado, de novo. Adeus.
Uma casinha bem velha. Mas bem cuidada. Com um jardim simples. Mas bem cuidado. Cássio bateu palmas.
- Alguém em casa? – gritou.
Sofia apareceu. Foi até o jardim e abriu a porta. Olhou atentamente para Cássio.
- Você é aquele velho. Nossa, você mudou. Que roupa é essa? Ficou rico?
- Não, eu ganhei.
- Sei... Então o que você quer?
- O seu amor.
- Eu não tenho nenhum para dar.
- É mesmo? Como você consegue?
- Eu não sei.
- Tudo bem. Isso é para você.
- O que é?
- Um caderno. Fiquei a madrugada toda escrevendo esses poemas. Todos esses poemas são seus.
- Meus?
- Sim.
- Mas para que eu vou querer isso?
- Depois que você ler a última palavra. Talvez descubra.
Sofia abriu o caderno. Tinha um título. Efeito Borboleta...
- Efeito Borboleta? O que é isso?
- Todos esses poemas são parte disso.
- Sim, mas o que é Efeito Borboleta?
- É quando o bater das asas da borboleta escondida em seus olhos cria um furacão dentro de mim.
Cássio, na mesma hora, vira as costas e caminha. Enquanto que Sofia segura o caderno em volta de seus braços e olha para Cássio partindo.


Rafael estava em seu carro. Parado. Em frente à casa dos avós do seu filho, que tomavam conta dele. Então vou continuar parado? Rafael sai do carro. Caminha. Bate na porta. Seu filho atende.
- Pai?
- Sou eu, Jonas.
Os dois ficaram imóveis.
- Onde você esteve?
- Eu precisei me ausentar por um tempo, me desculpe.
- Tudo bem, pai.
- Você quer ir na montanha russa? – pergunta Rafael.
- Que? Eu já tenho 18 anos, pai.
- Não importa. Vamos?
Jonas ficou pensativo, mas aceitou, não via o pai há muito tempo.
- Tudo bem.
Rafael esperava, enquanto Jonas se arrumava.
- Bom, estou pronto. – diz Jonas.
- Então vamos.
Os dois entraram no carro. Rafael deu a partida. No caminho.
- Pai, porque você sumiu depois que a mamãe morreu?
- Eu tive medo, filho.
- Eu também. Mas você não estava aqui para ver.
- É... – uma secura invadia a boca de Rafael.
Permaneceram calados desde então. Chagaram no parque. Enfrentaram a fila e ficaram enfrente aos carros da montanha russa. Rafael deu um leve sorriso para Jonas.
- Então vamos encarar, né? – diz Rafael.
- É, vamos.
Os dois sentaram no carro. O carro começou a se mover. O nervosismo penetrava em Rafael.
- Jonas, será que você pode segurar minha mão. Eu tenho medo de altura.
- Está bem.
Jonas segurou a mão de Rafael no instante em que os carros caíram em alta velocidade. O medo. A sensação de vomitar. Os olhos se fecham.
Jonas venha aqui! Eu vou te pegar! Jonas jogava água da mangueira em mim. Eu vou te pegar, Jonas! Corri em todos os cantos, mas o moleque era rápido. Rindo de mim. Ele corria. Eu ria de mim. Eu corria. Eu vou te pegar! Ele não conseguiu fugir. Agarrei, e nós dois caímos no chão em gargalhadas. Olhei para ele. Eu não sei o que aconteceu, apenas senti vontade de abraçá-lo. E o fiz. Nós dois caminhávamos. Sua mãe apareceu. Estava sorrindo. Sabe o que eu tenho aqui? Ela perguntou. Ela mostrou sua mão delicadamente fechada. O que você tem ai? Perguntamos. Ela veio aqui para ver vocês. Abriu lentamente a mão. Uma borboleta. Batia as asas. Os três se olharam.
O carro parou, a volta acabou. Mas Jonas ainda segurava a mão de Rafael, agora mais fortemente.

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