sábado, 28 de abril de 2012

A separação do encontro

Não sabia que o cheiro de flores poderia chegar tão longe, e se espalhar por essas ruas largas e estreitas dessa cidade amargada por suas próprias entranhas, também não sabia se era o perfume dela, ou se estava sendo enganado mais uma vez por seu olfato, sentido um tanto safado, mas sensível aos aromas dos amores perdidos na multidão. Os ventos avançam sorrateiros, não disfarçam quando tocam o seu rosto com firmeza e seus olhos fecham e abrem no mesmo instante em que os pelos da minha nuca arrepiam pela sensação que passou. Os ventos seguem lúdicos, brincando de levantar as saias das mulheres petrificadas pela espera, e os homens aproveitam a situação para abraça-las na esperança nas coisas do amor, e a estação de trem se torna uma coadjuvante abandonada pelo tempo do agora. Nossos corpos vagarosos, receosos e espantados buscam ocupar o espaço vazio entre nós, tentando dizer sobre os desejos medrosos de corações enganados pelo destino. Nossos gestos desiludidos tentam se encontrar no instante que passou, segundos antes de se desencontrar pelos caminhos falhos da nossa jornada. Segurando os pesados trilhos da vida, nos cumprimentamos da mesma forma tímida da primeira vez que fomos apresentados, e na falta de palavras sinceras apenas sobram os olhares furtivos de quem espera que tudo termine rápido para, finalmente, seguir em frente. As marcas violentas cuidadosamente infligidas por nós, são cicatrizes visíveis a olho nu, e as mágoas ficam mais que qualquer outra coisa, para pisar nelas, lembrar delas, usufruir delas, e guardá-las com carinho para nos comprometermos a não viver mais isso, e saímos com ego renovado e mais sábios do que nunca. Então ela me pergunta: você vê o que eu vejo? O esforço de ver é a agonia dos meus dias. Ela aponta para os cantos obscuros da visão dizendo que há uma beleza escondida por lá. Esfrego o rosto, talvez seja cansaço ou sono, procuro com os olhos cada detalhe que tenha passado despercebido, mas não, não a nada lá, somente a velha realidade estampada na cara. O feroz barulho do trem chegando nos acorda no susto e esquecemos o assunto. A atenção de todos é desviada para o trem, imenso que causa espanto com seu corpo metálico, e uma algazarra toma forma quando ele retorna a sua estação de origem. Concentrados em nossos destinos e levados pela multidão insensível ao seu redor, embarcamos em diferentes vagões deixando a estação vazia, sem emoção e recordação do que aconteceu ali, pois só dizemos o que podemos admitir. Enquanto o trem começa a se deslocar, partindo para outro lugar, sentamos numa cadeira vaga, nos acomodamos e não resistimos em olhar pela janela, então o silêncio da viagem confessa a vontade gritante que temos de descer na próxima estação, para podemos compreender porque não demos um beijo de despedida.

Nenhum comentário: